quinta-feira, 13 de novembro de 2008

A volta dos que não foram

É difícil destacar-se num mercado saturado com tantos artistas e lançamentos de CDs. A banda Del-O-Max, de Campinas, encontrou uma fórmula de sobressair-se no meio da multidão. Lançou ano passado seu álbum mais recente, Too Hard, em formato de vinil – aqueles “bolachões” que dominaram o mercado fonográfico entre as décadas de 50 e 80. A banda resolveu arriscar ao notar que o número de consumidores em busca desse formato cresce no país e no mundo. Enquanto a tecnologia dos CDs perde espaço para os práticos aparelhos de MP3, observa-se, curiosamente, também um ressurgimento dos bolachões e das pick-ups em que eles são tocados. “O som da nossa banda tem esse lado meio retrô e o vinil parece completar aquela sonoridade que a gente estava querendo alcançar já faz tempo”, opina Guilherme Campos, guitarrista e vocalista da banda. Por via das dúvidas, o novo trabalho também foi lançado em MP3, para não discriminar os fãs. “É para quem quiser fazer download, ouvir e mostrar para os amigos”, diz Guilherme.

Mas como um formato tecnologicamente ultrapassado como o vinil, substituído pelo CD, pode voltar em plena era digital? Em parte graças aos DJs, que nunca abandonaram o formato. Os adoradores do bom e velho toca-discos também garantiram a sobrevivência desse grupo, mas o fato é que ele vêm ganhando novos adeptos. "O vinil virou um objeto de consumo atraente, ‘cool’, e teve seu charme recuperado. Enquanto o formato CD é cada vez mais questionado, o vinil manteve um público cativo", comenta o jornalista, músico e tradutor Ricardo Cruz. “Essa é uma das justificativas para o mercado de LPs estar em ascensão”. Em 2007, cerca de 1 milhão de “bolachões” foram vendidos apenas nos EUA, um crescimento de 36% nas vendas em relação ao ano anterior. No mesmo período, a queda nas vendas de CDs foi de 19%, segundo dados do Nielsen SoundScan, o sistema que reúne informações sobre o setor musical.

É possível achar lançamentos em vinil de bandas novas que vêm ganhando espaço, por exemplo, LCD SoundSystem e The Racounters, e também de artistas consagrados como Paul McCartney e Madonna, Foo Fighters e Coldplay. Ótimos relançamentos também estão pelas lojas; clássicos de Metallica a Abbey Road e Sgt. Peppers, dos Beatles, Blonde On Blonde, de Bob Dylan e Aladin Sane, de David Bowie, a Physical Graffit, do Led Zeppelin e muitos outros nostálgicos. O preço? Nas lojas brasileiras como Saraiva e Livraria Cultura, todos acima de 50 reais; já no site Amazon, a média varia de 12 a 50 dólares.

Charles Leitão, produtor musical e criador do Clube do Vinil em Campinas, também atribui o culto à sensação transmitida ao colocar a agulha sobre a bolacha preta e ouvir os artistas preferidos, com o som da época em que fora lançado. “O som do vinil é algo único”, diz Leitão. “Não consigo entrar nessa de internet, baixar as músicas e pronto. Essa coisa de você não sentir, de não conseguir pegar a música, é estranho. Eu sou da época em que se comprava vinil, se fazia coleção e havia estantes ocupando o espaço na sala só pra guardá-los. E ainda faço isso” afirma. "Você pode até baixar um disco inteiro pela internet, mas nunca terá uma contracapa autografada pelo seu guitarrista preferido, nem poderá vibrar de emoção quando encontrar aquele álbum raro dando sopa num sebo”, completa.

Em comum, muitos aficionados cultuam o ritual nostálgico de virar o disco na vitrola, apreciar as ilustrações e fotos das capas e, acredite se quiser, sentir o cheiro do pvc. No meio musical é possível encontrar histórias inusitadas como a que Maurício Struckel, guitarrista da Del-O-Max, presenciou na “banquinha” de discos que levam aos shows. ”Apareceu uma menina, pegou o disco, abriu e fez uma coisa inimaginável; começou a cheirá-lo com o maior prazer do mundo e dava para ler o lábio dela dizendo: ‘vinil, vinil!’ e continuou cheirando o disco (risos). É uma coisa que tem cheiro, que você pega”, diz.

O som emitido pelo clássico formato plástico é bastante característico. Os aficionados destacam o “chiadinho” ao fundo da música, um efeito de abafamento, que, segundo dizem, dá a sensação de a banda estar ao seu lado. Os apreciadores afirmam que, além da melhor qualidade sonora, o LP é um desafio certo ao músico. Como o vinil comporta apenas 10 ou 12 músicas, o artista tem de realmente selecionar o repertório escolhido para cada álbum. Um dos problemas do disco de vinil é a sua durabilidade. “A do CD é infinitamente melhor, pois, como não há atrito com agulha, a mídia não se deteriora como ocorre com o vinil e a fita magnética cassete”, ressalta Tomi Terahata, consultor de tecnologia musical e técnico de som na EM&T - Escola de Música e Tecnologia. “Mas os CDs deixam os graves menos envolventes e os agudos um pouco mais agressivos, estridentes”, afirma. Em meio ao debate sobre a fidelidade do CD comparada à do vinil, não deixa de ser irônico que ambas as mídias tenham sido superadas por um formato, o do MP3, baseado na compressão de arquivos digitais e na perda de qualidade sonora.

A venda de discos usados é um motor importante do mercado do vinil. A chama do LP é mantida acesa por meio do grande número de sebos, além de sites de vendas, como eBay e Mercado Livre. Usuários do eBay compram 6 discos de vinil a cada minuto, ou 3 milhões de discos ao ano. Uma média incrível para um formato “morto”, não? Existem várias lojas especializadas nas antigas bolachas. Nelas, é possível encontrar desde ofertas que não pesam tanto no bolso até raridades com preços estratosféricos. A Riva Rock Discos, em Campinas, trabalha há mais de sete anos no ramo dos discos, tanto os clássicos de vinil, na maioria de segunda mão, quanto os desacreditados CDs. “Vendo LPs para garotos de 10 anos a pessoas de 60. Todo mundo vem”, comenta Riva, que, por meio de sua loja, procura misturar os diversos estilos musicais como forma de acoplar as pessoas ao vasto e diversificado mundo da música. “A gente procura ter tudo sem discriminação; desde Jazz, do Blues mais primitivo até o Death Metal.” Foi Riva quem ajudou a banda Del-O-Max a amadurecer a idéia de lançar o novo trabalho em vinil. “Foi uma das melhores coisas que já fizemos”, diz. Riva tenta ajudar bandas que considera interessantes a gravarem demos e ainda produz eventos para a divulgação de artistas cultuados. “No rock, há muita injustiça. Muita gente foi esquecida e outras pessoas fizeram sucesso em cima deles. Então, a gente procura divulgar todos”, afirma. “A loja existe há sete anos e nesses setes anos estamos no vermelho. Mas mesmo assim tentamos ajudar”, comenta Riva, que atesta a qualidade da Del-O-Max: “Amizade a parte, a banda é boa!”

Del-O-Max:

- Guilherme Campos – Baixo e vocal

- Renato Henriques – Baixo

- Mauricio Struckel – Guitarra e vocal

- Alessandro Poeta Soave - Bateria


(Texto produzido no primeiro semestre de 2008, segundo ano de faculdade)

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